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Amiloidose cardíaca
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Amiloidose cardíaca 

A amiloidose caracteriza-se pelo depósito de uma proteína fibrilar amorfa, chamada proteína amiloide, no miocárdio (músculo cardíaco) e em outros tecidos do corpo humano. É uma doença de diagnóstico tardio, e a principal causa de morte em seus portadores é a insuficiência cardíaca (coração fraco).

Classificação

De modo geral, a amiloidose pode ser classificada como primária (AL), secundária, relacionada à diálise, e associada à transtirretina (TTR).

-Amiloidose primária (AL): 

É a forma mais comum de amiloidose. É uma doença sistêmica, ou seja, que afeta vários orgãos, predomina em uma população mais idosa e indivíduos do sexo masculino. Os dois orgãos mais afetados são os rins (causando síndrome nefrótica, por exemplo) e coração (cerca de 50% dos casos apresenta acometimento cardíaco).

Aproximadamente 5-10% dos pacientes com amiloidose primária apresentam evidência de mieloma múltiplo, e vice-versa.

O comprometimento cardíaco geralmente leva à insuficiência cardíaca com função ventricular preservada (a força de contração do coração, chamada de fração de ejeção, é normal quando avaliada pelo ecocardiograma). Geralmente ocorre diminuição do relaxamento cardíaco (disfunção diastólica) em fases iniciais da doença. Em estágios mais tardios, pode ocorrer uma queda da fração de ejeção. O sistema de condução elétrica do coração também pode ser afetado.

O fígado também pode ser prejudicado pelo depósito de proteína amiloide, causando elevação das enzimas hepáticas e hepatomegalia (aumento do tamanho do fígado).

-Amiloidose secundária (AA):

A amiloidose secundária (AA) é identificada em quadros clínicos de inflamação crônica, como artrite reumatoide, psoríase e, mais recentemente, as denominadas doenças autoinflamatórias, como a doença inflamatória intestinal.

Nessa forma o rim é o orgão mais afetado, embora existam relatos de envolvimento cardíaco.

-Amiloide relacionada à diálise:

É típica de pacientes renais crônicos submetidos à diálise ao longo tempo. Nesta forma, em especial, o quadro predominante é de acometimento osteoarticular, como a síndrome do túnel do carpo e envolvimento do manguito rotador dos ombros.

-Amiloidose associada à transtirretina (TTR):

A amiloidose cardíaca associada à transtirretina (TTR) é a segunda forma de amiloidose com maior prevalência de acometimento cardíaco, podendo ser dividida nas formas hereditária (forma mais rara de amiloidose) e sistêmica senil (selvagem). A proteína precursora é sintetizada predominantemente no fígado.

A manifestação clínica mais comum da amiloidose hereditária é a polineuropatia amiloidótica familiar, doença neurodegenerativa que afeta os nervos periféricos.
É estimado que 25% da população com mais de 80 anos apresentem algum depósito amiloide por TTR normal (também chamada de selvagem). Essa forma de amiloidose é conhecida como amiloidose sistêmica senil (ASS) por TTR selvagem.

Na forma senil, identificamos o depósito tecidual da forma
selvagem da TTR, sobretudo no músculo cardíaco, sendo observado
um quadro clinico de insuficiência cardíaca. Esse subtipo é tipico de idosos (mais de 70 anos) e do sexo masculino.

A forma hereditária, ao contrário da senil, acomete pacientes em diferentes faixas de idade, mas predominando uma idade média inferior à encontrada nos pacientes portadores da forma senil.

Sinais e sintomas

A cardiomiopatia da amiloidose é classicamente descrita
como um modelo de insuficiência cardíaca que acomete ambos os ventrículo, muitas vezes com predomínio direito, cursando com ascite (acúmulo de líquido na cavidade abdominal) que antecede o edema de membros inferiores (inchaço nas pernas), e a hepatomegalia (aumento do fígado) ao exame físico. O edema pulmonar (acúmulo de líquido nos pulmões é um quadro menos frequente na cardiomiopatia da amiloidose).

Um tipo mais raro é o envolvimento do septo interventricular (músculo que separa o lado direito do lado esquerdo do coração) com depósito do material amiloide promovendo o espessamento desproporcional da região, simulando um quadro de cardiomiopatia hipertrófica.

A ocorrência de desmaios (síncope) por comprometimento do sistema nervoso autônomo é comum, e confere maior risco de morte.

A arritmia ventricular maligna, quando presente, é uma causa comum de morte no portador de amiloidose cardíaca e esses pacientes são fortes candidatos ao implante de desfibriladores automáticos (dispositivos que identificam arritmias cardíacas graves e as tratam imediatamente com um choque elétrico).

A amiloidose primária AL pode cursar com fibrilação atrial e formação de coágulos dentro dos átrios (câmaras cardíacas superiores e menores do coração), os quais podem sair do coração e causar um acidente vascular cerebral.

Diagnóstico

Na história clínica podemos suspeitar de amiloidose cardíaca em pacientes com idade igual ou superior a 50 anos, que apresentam sinais e sintomas de insuficiência cardíaca, com fração de ejeção do ventrículo esquerdo maior ou igual a 50% (avaliada pelo ecocardiograma) e que com o tratamento não apresentam
melhora dos sintomas.

Deve-se considerar manifestações que não são cardíacas na história do paciente como norteadoras do diagnóstico da insuficiência cardíaca pela amiloidose, tais como polineuropatia periférica, síndrome do túnel do carpo, hipotensão ortostática (queda da pressão arterial na posição de pé), hematomas de origem desconhecida e distúrbios de condução elétrica do coração.

-Eletrocardiograma:

O achado de um complexo QRS de baixa voltagem, desvios do eixo elétrico e bloqueios de ramo podem ser encontrados. Arritmias são frequentes, em especial a fibrilação atrial, que está relacionada com infiltração amiloide do átrio, e arritmias ventriculares complexas.

-Ecocardiograma:

Um achado de hipertrofia do ventrículo esquerdo no ecocardiograma associada ao eletrocardiograma com QRS de baixa voltagem (ao contrário do que se poderia esperar) aumenta a suspeição de amiloidose cardíaca. Outro critério para a suspeita de amiloidose cardíaca é o espessamento da parede ventricular esquerda acima
de 12 mm na ausência de história de hipertensão arterial (a causa mais comum para esse achado).

Outros achados que podem estar presentes no ecocardiograma são o aumento dos átrios com ventrículos de tamanho normal, derrame no pericárdico e evidências de disfunção diastólica devido ao padrão de cardiomiopatia restritiva.

A medida da espessura do septo interventricular pode sugerir o tipo de amiloidose presente no paciente, sendo frequentemente maior nos casos de amiloidose por TTR do que a forma AL, podendo em muitos casos ser superior a 20 mm. No entanto, a separação entre essas duas formas em bases clínicas nem sempre é possível.

Em alguns pacientes com amiloidose cardíaca podemos observar um achado clínico semelhante à cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva devido a presença do gradiente dinâmico de pressão que está relacionado a um “estreitamento” adicional da via de saída do ventrículo esquerdo.

Mais recentemente, o strain sistólico longitudinal tem sido utilizado para o diagnóstico da disfunção sistólica em pacientes com amiloidose cardíaca, podendo mostrar a preservação da ponta do coração em relação as demais paredes.

-Biópsia:

Pode ser realizado o aspirado de gordura abdominal (menor sensibilidade para a forma TTR), no entanto, a biópsia endomiocárdica do ventrículo direito pode ser fundamental para o diagnóstico de amiloidose cardíaca.

O estudo histoquímico das amostras dos tecidos é importante a fim de se estabelecer uma distinção entre as formas hereditária, senil, sistêmica e primária, em virtude das diferenças de tratamento e gravidade.

-Ressonância magnética:

A ressonância magnética surge como mais uma alternativa para o diagnóstico da amiloidose cardíaca, com uma sensibilidade de 87% e especificidade de 96% para a forma associada à TTR.

Através desse exame é possível identificar o espessamento miocárdico e do septo interatrial, sinais de disfunção diastólica, e o típico padrão de realce tardio subendocárdico no ventrículo esquerdo, que pode também acometer todas as câmaras cardíacas.

-Medicina nuclear:

O radiotraçador Tc99m, que se liga à TTR mas não aos derivados da cadeia leve, é um método eficaz de avaliação diante das formas mutante ou selvagem da amiloidose cardíaca associada à TTR.

Tratamento

Tem como objetivo o controle das complicações relacionadas ao coração devido ao depósito amiloide e o tratamento da doença de base para prevenir novas formações amiloides.

O tratamento da amiloidose cardíaca tem como objetivo melhorar os sinais e sintomas da insuficiência cardíaca. O emprego de diuréticos em baixa dose melhora os sintomas relacionados a congestão (acúmulo anormal de líquidos), enquanto que o uso da combinação de betabloqueadores e inibidores da enzima conversora da angiotensina tem o seu beneficio ainda não definido na amiloidose.

Deve ser avaliado o uso de anticoagulantes em caso de fibrilação atrial e na detecção de trombos (coágulos) dentro dos átrios e/ou ventrículos.

-Amiloidose primária (AL):

Nessa modalidade, o papel do hematologista é fundamental. Existem algumas medicações que podem ser usadas: melfalano associado à dexametasona (MelDex) e bortezomib associado à ciclofosfamida ou dexametasona. Outra opção é o transplante de células tronco.

-Amiloidose associada à transtirretina (TTR):

Drogas como o tafamidis e diflunisal podem ser usadas, pois podem diminuir a produção da proteína amiloide. O  transplante de fígado (visa substituir o gene mutado TTR que produz a maioria da transtirretina circulante por um gene encontrado em um órgão do doador geneticamente normal) pode ser uma opção para alguns pacientes.

Fonte: Arquivos Brasileiros de Cardiologia.

Autor: Dr. Tufi Dippe Jr – Cardiologista de Curitiba – CRM/PR 13700.

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